segunda-feira, 2 de julho de 2012

Índia - parte 10

Taj Mahal

Já que chegamos à Índia, tínhamos que ir ao Taj Mahal. O contrário seria impensável. Saímos do hotel de manhã e fomos caminhando. Depois de uma hora andando, estávamos no parque que antecipa a chegada. Como sempre, uma multidão. Centenas de meninos jogando críquete, charretes e mais charretes de camelos, vendedores de tudo quanto é inutilidade, etc. Enfim, chegamos.

Compramos bilhetes, pegamos a fila, uma para homem e outra para mulher, a fila foi furada várias vezes, fomos revistados e estávamos dentro. Várias pessoas se benziam viradas para o complexo, ainda do lado de fora. Podia ser que apontavam para uma mesquita, o que eu mesmo duvidava, pois a mesquita estava em outra direção. Primeiro passamos por um conjunto de prédios avermelhados. Beleza incontestável. Enfim, passa-se por um imenso portão e se avista o mausoléu, que é o prédio principal. Mesmo estando um pouco sucateado com jardins em frangalhos e vários poços, que são partes importantes do complexo, secos, ficamos impressionados. É algo realmente bonito, que não deixa margem para se imaginar algo mais belo. Cada pedra do revestimento, cada escada, pórtico, parece que tudo recebeu a atenção especial de mestres da arte de esculpir o mármore.

Porém, quando vemos palácio como um todo, é também uma obra prima no meio daquela paisagem. Lá dentro, em um salão, dentro de mais uma cerca de mármore finamente entalhado está o túmulo de Aryumand Banu Bengam, esposa favorita do Imperador Shah Jahan, que morreu ao dar a luz seu décimo quarto filho. Esta obra já foi apontada como a maior prova de amor da história. Levou 22 anos para ser construída, entre 1630 e 1652. Mais de 20 mil pessoas trabalharam no empreendimento. Há lendas, altamente factíveis, que os melhores artesão eram executados após concluírem algum trabalho, para não refazer o trabalho para um rei concorrente. Após sua morte, o corpo do ex-imperador foi sepultado ao lado da esposa e constitui a única parte que “fere” a simetria perfeita de tudo que ali foi construído.

O preço para visitantes estrangeiros era cerca de 15 dólares. Para indianos, menos de meio dólar. Gostamos disso.

Várias paredes do interior do mausoléu estão enegrecidas em uma faixa cerca de 1,5 metros. Isto aconteceu porque vários visitantes indianos fazem todo o trajeto passando a mão na parede se benzendo e deixando para trás uma camada de lipídio e poeira que fazem o papel de uma graxa. O diálogo a seguir com certeza já ocorreu alguma vez: Ué! Mas por que? Ora, algo tão bonito só poderia ser sagrado! Então as pessoas vão lá e rezam e se benzem. Mesmo aquilo sendo apenas um mausoléu de uma pessoa que não fez nada demais; apenas foi amada por um louco, como um louco.

Normalmente isso não acontece. Por exemplo: eu amo Pretinha como um louco. Mas eu não sou louco. Pelo contrário. Eu sou normal! Então se ela morrer antes de mim não vou construir pra ela um Taj Mahal.

Já bati nessa tecla algumas vezes e sei que estou sendo repetitivo. Mas a Índia me mostrou isto. E aprendi assim a ver o quanto do nosso tempo e dos nossos recursos gastamos construindo coisas que não tem utilidade alguma. Para isso trabalhamos feito loucos e nos privamos de aproveitar nosso escasso tempo com as pessoas que realmente amamos e deixamos de fazer o que realmente queremos e gostamos.

Agra é uma região seca. É cortada pelo rio Yamuna, mas os arredores é árido. Sentado em um degrau de mármore, olhando aquela paisagem gasta, aquele povo sofrido, tentei calcular quantos quilômetros de canais seria possível construir ao longo de 22 anos usando 20 mil trabalhadores, seus elefantes cavalos e camelos. Depois, tentei fazer as contas de qual a área que seria possível ser irrigada com esta água e quantas famílias se beneficiariam disto. Depois, tentaria capitalizar isto ao longo do tempo, quase 400 anos. Dezenas de gerações de milhares de famílias de Indianos seriam poupadas da miséria extrema se um megalomaníaco tivesse deixado de pensar em seu próprio umbigo e ter feito o que era seu verdadeiro dever como governante, cuidar de seu povo, e não explorá-lo para realizar suas loucuras. Isso vale para o Taj Mahal bem como para dezenas de obras na Índia e ao redor do mundo. E vale para muito do que se faz hoje em dia.

No momento em que este texto era escrito, a estimativa dos custos das obras da Copa de 2014 no Brasil eram de mais de 11 bilhões de reais. Já o salário médio de um professor primário no Brasil é o terceiro mais baixo de uma lista de 38 países desenvolvidos e em desenvolvimentos, segundo UNESCO. Pagamos metade do que se paga no Uruguai. Em BH uma faxineira diarista facilmente pode ganhar mais do que uma professora do Estado trabalhando 40 horas. Afinal, quem são os loucos?


Um comentário: