sexta-feira, 31 de agosto de 2012

China - parte 15

Viagem de Beijing a Mănzhōulǐ

No dia da partida fechamos a conta no albergue e fomos para a estação com bastante antecedência. A estação é organizada, mas há pouquíssimas indicações em inglês. A gente ia mostrando nosso bilhete para os funcionários e eles indicavam o caminho. Por fim estávamos no nosso trem, no nosso acento. Este não era, como já disse, um trem do tipo Expresso Transiberiana. O acento é revestido com algum estofado, mas é completamente rígido e não inclina. Há uma mesinha para ser compartilhada por cada 4 ou 5 passageiros.

Tentamos não dormir de dia para que o sono viesse forte a noite. Demos o azar de compartilhar a mesinha com um chinês gorducho e mal encarado que usava a mesinha inteira só para ele dormir. Em outras partes, essa mesinha era compartilhada por 4 pessoas que apenas apoiavam a cabeça. A gente lia, jogava pif, que não exige espaço, e dava voltas pelo trem.

Em cada vagão há um ponto onde se pode pegar água fervendo. Então a chinesada usa e abusa dos macarrões tipo miojo, que são vendidos para todo lado e até dentro do trem, em potes próprios para receber água fervendo. A gente não tinha ainda essas manhas, mas levamos bastante comida. Duas vezes ao dia funcionários passavam vendendo comida e bebida. Neste trem há um marmitex muito interessante. Custava cerca de 1,5 dólar. Não era nenhum banquete, mas valia bem por uma refeição. Mas muitos chineses passavam o dia inteiro só comendo o macarrão de pote. A mesma ração, 4 ou 5 vezes no mesmo dia.


Percebemos que o funcionário do vagão estava superfaturando a água mineral que ele vendia pra gente. Quando compramos a primeira vez perguntamos o preço e ele indicou 3,00 yuan. Depois Renilza viu chineses pagando 2,00. Na segunda vez que fomos comprar, Renilza pegou uma garrafa no carrinho, o funcionário tomou a garrafa da mão dela e a entregou outra. Ela olhou para o carrinho e viu escrito 2,00. Aí descobrimos que em algumas estações dá pra descer e comprar coisas dos ambulantes. Assim passamos a comprar água do lado de fora do trem, nas paradas, por 2,00 yuan.

Na primeira noite perdemos a hora do marmitex e nos atrasamos para jantar no vagão restaurante. Estávamos fazendo algo muito importante que era jogar pif. Quando chegamos ao vagão restaurante naquele horário ainda vendiam uma refeição que não entendemos o nome. Mas pelo preço, cerca de 7 dólares cada (na China isto não é pouca coisa), imaginamos que seria algo que substituiria um jantar. Grande erro. Se tratava de uma bandeja redonda com umas divisões. Em cada uma havia uma espécie de bala ou docinho, todos horrorosos. Principalmente para quem esperava um pratão, tipo arroz carne e vegetais. Comemos o que conseguimos e voltamos para os nossos lugares.


A noite foi melhor do que esperávamos. Na verdade, esperávamos ter a pior noite de nossas vidas. Mas como conseguimos apoiar as cabeças um no outro ou na janela ou numa quina da mesa e somando os breves períodos de cochilos de uns 15 minutos ou meia hora, conseguimos umas boas 3 ou 4 horas de sono. Ou seja, esta noite não está nem entre as dez piores noites da minha vida.

O segundo dia foi mais tranquilo. Já tínhamos pegado o esquema do rango e a paisagem era interessante. Muita grama e colinas, vez em quando uma cidade inteira em construção, com dezenas ou centenas de prédios cada um com sua grua. A paisagem lembrava o que esperávamos da Mongólia. Agora não era mais necessário segurar o sono. Se quiséssemos podíamos dormir à vontade, pois a próxima noite já seria em um hotel.

Faltando umas 6 horas para o fim da viagem conhecemos o Andy. Esse não é seu verdadeiro nome em chinês, mas é costume dos chineses se apresentarem para os ocidentais com um nome Inglês. Nós até perguntamos seu nome em chinês, mas realmente era difícil pronunciá-lo. Andy tinha uns 20 anos, falava um bom inglês e batemos um papo legal. Ele desceu e logo entrou um grupo de uns 6 chineses camponeses que se sentaram perto da gente.

Agora o trem estava mais vazio e a gente podia ficar bem mais a vontade. Enfim, começamos uma conversa com os camponeses. Eles não falavam sequer uma palavra de inglês e nós de mandarim apenas “ni hao” (olá). Mesmo assim a gente conversou muito. Mostramos o Brasil num mapinha que levamos, eles fizeram sinais indicando futebol... era engraçado pra caramba. Aí, um deles saiu pelo trem afora e voltou com um adolescente pelo braço. O menino falava um pouquinho de inglês, mas estava um pouco envergonhado.

Aí ficou mais engraçado ainda, porque os chineses ficavam pedindo para o menino traduzir um monte de perguntas que eles estavam muito curiosos, mas o tímido menino não parecia muito interessado. E finalmente uma mulher se apresentou falando bem o inglês. A conversa foi bem, até que ela se ofendeu quando eu disse que no Brasil a gente chamava aquele chapéu cônico muito comum no Vietnam e mesmo no interior da China de “chapéu chinês”. Ela disse que eles não usavam mais, que a China era agora um país moderno, etc. Com muito custo eu consegui mostrar que respeitávamos muito a China, que sabíamos que em breve seriam a maior economia mundial, que foram os campeões nas Olimpíadas de 2008, etc.

Ela disse que só os camponeses usavam aquele chapéu. Ora, camponeses são chineses também e por fim a convenci de que o chapéu era muito bom e acho que ficou tudo bem. Ela nos ajudou transcrevendo o endereço de nosso hotel para a caligrafia deles, nos deu seu telefone e e-mail, para o caso de precisarmos. Ela vivia em Mănzhōulǐ, nossa próxima parada e nos alertou que lá só se falava chinês e russo.

Enfim chegamos. Depois de 36 horas em um trem de banco duro e mal alimentados queríamos muito um bom hotel para podermos descansar bem. Mas não tínhamos ideia do que nos esperava.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

China - parte 14

A transiberiana

Chegamos a ler em algum lugar que a Transiberiana era o Everest dos mochileiros. O sonho de 10 entre 10 viajantes. Talvez seja exagero, mas a gente estava apreensivo. Há várias formas de fazer esta viagem. As mais comuns são de Moscou a Vladvostok, totalmente na Rússia, Moscou a Beijing via Mongólia e Moscou a Beijing via Manchúria. Escolhemos esta terceira opção, acrescentando o trecho Moscou – São Petersburgo. Porém no sentido seria inverso, partindo de Beijing. No total seriam 9.700 quilômetros. Isto corresponde a quase um quarto de uma volta ao mundo feita na linha do equador.

Como os países envolvidos estão, para nós ocidentais, classificados como “exóticos” e pouco se fala de Inglês tanto de Beijing quanto em Moscou, para quem começa em Beijing o Lonely Planet acaba indicando que se procure a agência CITS. Não ficamos satisfeitos. Sabíamos que era possível comprar as passagens diretamente na estação. Fomos a um centro de informações turísticas em Beijing para saber como comprávamos esta passagem na estação. Ele disse que não dava, que tínhamos mesmo que procurar a CITS, etc. Não aceitamos e fomos atrás de mais informações. Depois de estudar muito definimos o seguinte: iríamos de Beijing a Mănzhōulǐ, cidade chinesa na fronteira com a Rússia. Passaríamos a fronteira de ônibus, viagem de 15 minutos e chegaríamos a Zabaykalsk. Daí era ir pela Rússia até chegarmos a São Petersburgo.

Chegamos na estação e descobrimos que no guichê 16 era possível o atendimento em inglês. Tentamos comprar a passagem, mas só vendiam com no máximo 3 dias de antecedência. Então tivemos que esperar. No dia em que voltamos para comprar, pedimos que a recepcionista do hotel escrevesse em um papel o que queríamos. O atendente não falava aqueeeeeele, inglês, mas se esforçava. Conseguimos comprar os bilhetes em um trem local, bem mais barato, mas só tinha vaga para cadeira, que depois viemos a descobrir que era bem desconfortável. Por 64 reais cada, compramos as passagens para um trecho de 36 horas. Bilhete personalizado, com o número do passaporte impresso. O primeiro passo estava dado.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

China - parte 13

Compras

Qualquer pessoa que divulgar em seu meio que vai visitar a China sofrerá um enorme assédio para que compre isto ou aquilo, pois a fama de lugar mais barato do mundo já correu o universo. Mas outra fama tão grande quanto esta é referente às falsificações. Roupas, relógios, tênis, eletrônicos, armamentos, etc. Ali tudo se cria e se copia. Comprar na China pode não ser um negócio tão bom. Mais ainda: fazer um bom negócio quase nunca é fácil.

Comerciante chinês é antes de tudo um negociador. Nenhuma quinquilharia é vendida sem uma negociação árdua. Pode-se tornar cansativo passar um dia inteiro dedicado a compras. Eles geralmente negociam bem, pedem alto, se fazem de ofendidos, ofendem, xingam. Não tem moleza. Muitas vezes começam pedindo um preço duas vezes mais alto que o das 10 bancas ao lado. Aí você fala: “mas seu preço está o dobro!” e eles simplesmente te pedem para falar o seu preço.

Pretinha gostou do negócio e em alguns momentos eu pensava que para ela aquilo era um jogo. Mesmo quando fechava um bom negócio se sentia lesada, pois se o outro aceitou sua proposta, logo ela pagou alto, pensava ela. Então pegamos o hábito de toda vez que comprávamos algo perguntávamos às meninas da recepção do hotel quanto aquilo valia realmente. Abaixo seguem três lutas.

1 – Cartão de memória. Perguntamos o preço em várias bancas do mesmo cartão de 8 Gb. Em todas iniciavam com R$26,00 (valores convertidos do Yuan para Real). Em uma banca a moça começou com o dobro. Eu disse que em todas as outras o preço era 26. Ela respondia perguntando: “qual o seu preço?”. Eu tentava a seguinte estratégia: pedia ao vendedor para já dizer o seu melhor preço, pois como todas as bancas vendiam o mesmo produto eu teria escolha. Não dava certo. Parece que há um acordo entre eles de não cederem a esse tipo de pressão. Resolvemos negociar:

- Quanto é esse Cartão? (Renilza)

- 26 (vendedora)

- Tá muito caro!

- Quanto você paga?

- 2.

A moça fica brava, fecha a cara e diz:

- Eu não estou brincando! Estou aqui para trabalhar!

Vira de lado, volta e continua:

- Esse cartão não é cópia. É original!

Renilza pergunta:

- Qual é o preço então?

- 23.

- Muito caro. Pago 3.

A vendedora apela, joga a calculadora de lado, como se estivesse encerrando a conversa. Na verdade as duas partes não falam uma língua em comum. Os preços são apontados na calculadora, que passa de uma para a outra. Raramente a vendedora usa um inglês muito mais limitado que o nosso. Mas as partes se entendem. A gente ameaça ir embora e a vendedora chama de volta. Reclama que estamos querendo pagar um preço impossível para ela. Renilza diz:

- Your final price!

- 20

- Muito caro. Pago 4.

E vão nesse ritimo. Finalmente a moça aceita vender pelo equivalente a R$8,00. A gente diz que iremos testar. Eu abro a câmera, tiro o cartão dela e coloco o da vendedora. O número de fotos que aparece disponível para ser armazenado equivale à memória de 8Gb. Fechamos negócio. A moça não dá um sorriso, como se a tivéssemos lesado. Renilza também fica com a sensação de que pagou alto. Ao chegarmos no hotel perguntamos às meninas qual o valor de um cartão de memória daqueles, caso elas fossem comprar. Dizem que seria uns R$10,00.

Nada mal


2 – Tênis Asics

Queríamos comprar tênis de corrida originais, pois como caminhamos muito e ainda tínhamos esperanças de fazermos uns treinos de corrida, não compensa usar tênis de má qualidade. Mas encontrar lojas que vendem artigos de marcas conhecidas não é tão fácil, exceto Nike. Mas buscávamos Asics e Mizuno. Como não achamos nada do jeito que queríamos, fomos atrás dos falsificados mesmo. Em um mercado, entramos numa loja e eu apontei o modelo que queria. Se tratava de um “Asics” de um modelo que eu conheço. Na verdade, uma cópia razoavelmente fiel no visual e grosseira nas costuras e nos amortecedores. No Brasil este tênis custaria entre 300 e 400 reais. Experimentei uns três modelos. Finalmente decidi pelo “Asics” descrito. Perguntei o preço e ela respondeu (valores convertidos para o Real):

- R$800,00

Eu apelei, me levantei e saí andando. Interpretei que, uma vendedora chinesa, na China, pedir por um tênis falsificado o dobro do valor de um original no Brasil é o mesmo que dizer na minha cara que eu sou um otário. Os maus vendedores na China acham isso normal, mas eu penso que eles podem poupar o cliente disso. Bom, saí andando. A menina me pede para eu dizer o meu preço e eu encerro, dizendo que desse jeito eu nem começo a conversa. Ela insiste, tenta me segurar pelo braço (nisso Renilza já está lá fora). Eu continuo andando, com ela arrastada (o piso é liso e ela muito leve). Ela insiste, insiste e por fim apela:

- Agora você me deixou nervosa!

E me dá um beliscão de verdade, que tirou sangue. Eu viro para ela e pergunto se está louca. Ela pragueja enquanto entramos em outra loja. Nesta loja eu já falo com o vendedor que não tente nos extorquir, pois na loja anterior a discussão não acabou bem e mostrei o ferimento. Ele ficou impressionado e já foi dizendo seu preço inicial por um “All Star”. Depois de experimentarmos os tênis, acabamos comprando nesta loja um par desse tênis para cada a R$22,00 cada. No Hotel nos disseram que valia uns 30.

3 – Robe de seda

Chegamos a uma loja e apontamos para o robe que nos interessava. A menina disse que o preço original era 800 Yuan, par que para a gente ela podia vender por 280. Renilza vira para mim e diz, na frente da chinesa:

- Vou falar o meu preço. Não ria!

Ela vira-se para a vendedora e diz:

- Ok. Pago 20.

A menina fica nervosa. Diz que lá no Balasil a gente até podia encontrar algo assim, mas na China não, porque os salários na China não eram tão baixos como no Balasil.

Renilza responde:

- Olha, eu no Brasil pagaria um preço muito melhor do que o que você pede. Se for para pagar caro eu prefiro pagar lá. Eu não atravessei o mundo indo até a China para pagar mais caro. Eu não sou europeia. Sou brasileira, pobre, trabalhadora...

Depois de falar um monte de abobrinha a vendedora diz:

- 150.

Renilza:

- 25.

- 145.

- 30.

Outra rodada de discussões exaltadas, eu ameaçando ir embora, fingindo estar nervoso. Finalmente, após Renilza começar a sair da loja a moça aceita nossa proposta, que naquele momento estava em 50 Yuan, ou R$17,00. Renilza, como sempre, acha que fez mal negócio. No hotel as meninas dizem que valia R$27,00. E nos elogia como bons negociadores. Aqui eu admito que o mérito é todo de Pretinha.

Coloquei estes casos aqui para mostrar uma coisa. Comprar na China pode até ser barato, mas é muito cansativo e em um dia de compras não dá para levar mais do que 3 ou 4 boas negociações. E se não for desse jeito o negócio acaba não compensando.

China - parte 12

O visto para a Mongólia

Quando estávamos em Hong Kong fomos ao escritório do consulado da Mongólia com toda a documentação que dispúnhamos para tentar o visto. Era quinta-feira. Como o horário de atendimento já tinha acabado, a moça nos mandou voltar na segunda, pois na sexta o escritório não funcionava. Então ficaria para Beijing.

Em Beijing fomos tão mal atendidos que resolvemos desistir do visto e retirar o país do roteiro. Os funcionários da embaixada são extremamente grosseiros. Até empurrões eles dão nas pessoas, quando a fila não está do jeito que eles querem. Quando chegou a nossa vez de sermos atendidos, nos cobraram uma carta convite. Falamos que não tínhamos amigos no país, que nossa intensão era apenas fazer turismo. Não adiantou.

Na fila conhecemos um australiano, um romeno e um francês. Depois de tomarmos uns empurrões do porteiro, entramos os cinco por que o atendimento era por batelada. Só o romeno tinha carta convite, enviado por um hotel. O funcionário da embaixada olhou os nossos passaportes e disse, em inglês rispidamente, algo assim, "Não posso aceitar o pedido de visto de vocês sem carta convite do ministério porque vocês são brasileiros. Ele é australiano, ele pode, ele é francês, ele pode, vocês são brasileiros, não podem".  

Um chinês que também entrou nessa batelada, ao ouvir isso nos disse que não precisaríamos desistir. Era só procurar uma agência de viagem em Beijing mesmo e pagar uma comissão que eles providenciariam tudo. Mas pagar "comissões" não faz parte dos nossos métodos, principalmente para ser convidado a visitar um país que a própria embaixada nos tratou mal. Se existe uma taxa de visto legal, pagamos sem problemas. Mas comissões não.

Voltamos ao albergue e pesquisamos na internet para ver se era possível que algum hotel Mongol podia nos mandar esta carta convite. Nesta etapa, usando sites de reservas de hotéis começamos a procurar algum para nos hospedar. Um dos critérios que usamos para escolher um hotel é ler os comentários dos últimos hóspedes. Foi aí que desistimos de vez.

Sobre um hotel um comentário dizia que se você não fizesse seus passeios agendando com o hotel os funcionários te tratavam mal. Outra pessoa disse que ao chegar no hotel que já tinha reserva, informou que já tinha os passeios agendados com uma agência. O gerente ficou com tanta raiva que cancelou a reserva e a turista teve que sair pela cidade, em alta temporada, procurando por outro hotel, o que conseguiu pagando muito caro.

Na verdade, se soubéssemos dessas coisas antes a Mongólia nem teria feito parte dos planos.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

China - parte 11

O Zoo de Beijing

Tendo tempo, não perca esta atração. Se trata de um zoológico muito bom, dotado de um ótimo aquário e apresentações de golfinhos, leão marinho, etc. A estrela é o panda gigante. Um dos símbolos do país que está seriamente ameaçado de extinção. Mas o país tem trabalhado forte para evitar isto. Tem no aquário duas belugas que ficam brincando com uma bola e que produzem um som altíssimo, que chega a incomodar. Além dessas feras, leões, tigres, elefantes e todo bicho que interessa tá presente. Até galinha lá tem.


Vila Olímpica

Em 2008 a China, além de ter sido grande vencedora dos Jogos Olímpicos com o maior número de medalhas de ouro impressionou o mundo também com as belas construções para os jogos. O Estádio Ninho do Pássaro se tornou uma atração turística e a seu lado está o Cubo D’água, outra construção muito charmosa.


Indústria

No segundo trimestre de 2012, quando estivemos na China o país apresentou crescimento de 7,4%. Para qualquer país do mundo isto seria um verdadeiro milagre econômico, mas se tratando da China, isso é entendido praticamente como uma recessão. Crescimentos acima de 10% foram rotina nas últimas décadas. O crescimento das economias de vários países depende em larga escala da economia chinesa. Fato é que, por onde quer que se ande, para onde se olhe o que se vê é um imenso canteiro de obras. Cidades são construídas do nada. A malha ferroviária, que já é muito abrangente em alguns pontos passa por duplicação. As pessoas trabalham muito. Em hotéis a gente encontra a noite o mesmo funcionário que nos atendeu pela manhã. Na construção civil a mecanização é largamente aplicada. Em consequência, é fácil ver que o chinês está orgulhoso do país. Em algumas décadas está projetado que a China será a maior economia do mundo. Não é para a gente ficar surpreso, afinal eles tem recursos, área, são trabalhadores e são uma ditadura, o que torna as decisões envolvendo economia mais fáceis.

sábado, 25 de agosto de 2012

China - parte 10

Salão de beleza

Pretinha ganhou, pela bondade do marido, o direito de cortar o cabelo. Digo bondade, porque necessidade não havia. Ela está sempre nos trinques. Mas mulher feliz é sempre mais carinhosa e por isso nunca devemos perder a oportunidade de alegrá-las, principalmente quando para isto não se gasta muito. Ela entrou no salão meio temerosa e foi perguntando: “alguém aí fala inglês?”. Logo a intérprete do salão fez que sim e a arrastou para dentro.

O cabelereiro se postou frente a seu desafio e com olhos de um artesão mirando a pedra bruta processava atentamente os desejos da cliente que eram traduzidos pela intérprete. Eu teria ficado com medo. Depois de se darem por entendidos Pretinha se sentou no banco do homem da tesoura com a certeza de que era a primeira vez que o cara pegava um cabelo crespo para moldar. Eu não quis aumentar o nervosismo no local e fui esperar no albergue.

Pouco depois ela chegou com o cabelo todo enjubado e sorridente. O lavou, passou o devido creme, ajeitou aqui e ali e estava pronta para as fotos de novo. Ela gostou do trabalho do cara e então, fica a dica para os próximos visitantes: podem deixar o cabelo para cortar aqui, que o serviço é tão bom quanto no Brasil, é mais barato e você pode fazer disso uma aventura.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

China - parte 9

Massagem

Bem próximo ao nosso albergue haviam vários “spas”, como eles chamam qualquer lugar em que se faz massagens e outras coisas para o bem estar do cliente. Fizemos a nossa visita, para matar a saudade da Indochina com uma sessão de quase duas horas. Mais da metade do tempo, as meninas com mãos fortes espremeram nossos pés e canelas e o resto do tempo era distribuído pelas outras partes do corpo. Diferente das massagens tailandesas, mas muito compensador também. Principalmente ao fim de um dia de longas caminhadas com calçado impróprio.

China - parte 8

Comida Chinesa

Aquilo que imaginávamos ser comida chinesa através do que vimos nos restaurantes do tipo no Brasil é pura ficção. Nada daquilo foi encontrado na China. Cachorros, escorpiões, cérebros de macacos e coisas do tipo, apesar de terem seus preparos dominados pelos gourmets mandarins, nos pareceu que só são servidos quando os anfitriões querem assustar e se divertirem com visitantes ocidentais, principalmente em comitivas de multinacionais. Por outro lado, vimos de quase tudo.

Para alimentar uma população que sempre foi enorme dispondo de recursos que, apesar de não serem escassos também nunca foram algo do que se pudesse dizer: “nossa, como há fartura nessas terras!” se fez de tudo. Ao que parece, qualquer coisa que pertencesse ao mundo dos viventes se tornou candidato a ir pra mesa do chinês. Ao longo dos milênios, este conjunto de povos tão criativo fez todas as combinações possíveis na panela ou no espeto.

E temos o resultado. Nunca vimos algo tão variado. Frituras, assados, cru, vivos, mortos, patos pescoçudos dependurados, peixes em aquários no meio dos restaurantes esperando pacientemente serem escolhidos, tartarugas, caranguejos, embutidos mil, etc, etc e mais etc. Pelas ruas na parte antiga da cidade se vê dezenas de bancas com bichos de todo tipo, vivos, esperando sua vez. Sopas, frutas, biscoitos. O difícil e não raro era conseguir pedir o que se queria, pois cardápios em inglês não são muito comuns. Mas quase tudo que comemos era saboroso, farto, barato e limpo.

Nenhum problema de intestino foi registrado. Pelo contrário: experimentados uma regularidade e consistência raramente repetidas. O chato era ter que tolerar a fumaça de cigarro nos restaurantes, com o que agora estamos nos desacostumando no Brasil, felizmente.


quinta-feira, 23 de agosto de 2012

China - parte 7

A grande muralha

Desde o primeiro dia em Beijing dois fantasmas nos perseguiam: a Cidade Proibida e a Grande Muralha. A cada dia que passava e não agendávamos o nosso passeio eu ficava preocupado. A Cidade proibida foi fácil de resolver, pois era do lado de nosso hostel. A muralha levou mais alguns dias, precisávamos de sol e estava chovendo quase todos os dias.

Desde criança esta construção me fascinou. Já adulto eu me questionava sobre o motivo e a eficiência de um muro desses. Sua construção teve início antes mesmo da unificação do país. Após o século II A.C. com o país unificado é que se começou a trabalhar para que os vários pontos já construídos fossem unidos por construções novas. Dependendo da região, característica dos inimigos e disponibilidade de material, vários desenhos, rampas, torres e outras fortalezas foram concebidos, de forma que não se trata de um conjunto uniforme. No século XV a muralha atingiu seu apogeu, com mais de 7.000 quilômetros existindo e funcionando como defesa.

Apesar de em vários momentos os inimigos, principalmente os mongóis, terem conseguido superar esta defesa ela foi fundamental para a manutenção do império, já que invadir a China se tornou uma opção mais complicada do que atacar outros povos mais frágeis na região. Há alguns séculos atrás ela perdeu a sua utilidade, pois a China expandiu suas fronteiras para além das muralhas e agora ela ganha toda a grana gerada pelo turismo sozinha.

Temos um pouco de aversão a lugares muito apinhados de turistas. Não ia ser nada mal se as atrações fossem exclusivas para a gente, pelo menos na hora em que vamos vê-las. Mas como não somos chefes de Estado e não temos grana para solicitar visitas privê, quase sempre temos que nos acotovelar com um tipo de gente muito indesejável: os outros. Mas, às vezes é possível dar um jeito de conseguir acesso a uma atração de forma que esses problemas sejam minimizados, por exemplo, escolhendo horários, fazer passeios por conta própria, sem envolver agências e, quando não tiver jeito, tentar ficar na frente do pelotão para ter a vantagem de algumas fotos sozinhos enquanto os outros vem chegando.

Mas para ver a muralha da China é possível procurar por passeios que levem a locais mais vazios. Os mais baratos levam a pontos mais próximos a Beijing, caindo turistas pelas beiradas. O que pegamos, que era um pouco mais caro, nos levou a um acesso recém reconstruído. Por isso estava praticamente vazio, apenas com o nosso ônibus. No caminho passamos por outro ponto onde pudemos avistar milhares de turistas. Cruz credo! Andamos mais meia hora e tivemos a muralha quase só para a gente.

Chegamos. O guia informou o horário de retorno e nos soltou. Não há como se perder porque a muralha é uma figura linear no meio da floresta. Só dava para ir para um lado. Então, depois de algumas informações turísticas, sobre segurança e sobre a história, era cada um por si. Um grupo disparou, nós fomos seguindo no nosso ritmo e vendo os mais desanimados ficando pelo caminho.

Agora eu podia imaginar a dificuldade que os invasores enfrentavam. Há quilômetros de distância já eram avistados pelos guardas, pois a muralha quase sempre foi construída na parte mais alta dos morros. Depois que eram avistados os chineses imediatamente mandavam sinais de fumaça, fogo ou sonoros e com isto conseguiam informar até a quantidade de invasores e conseguiam o reforço. Os inimigos ainda tinham que se aproximar subindo a montanha em uma vegetação que não era alta o suficiente para os esconder, mas era densa o bastante para dificultar a caminhada.



Bem antes de poderem causar algum mal aos soldados chineses já se tornavam alvos fáceis para arqueiros. Superadas essas dificuldades, se conseguiam chegar à beirada da muralha, eram alvos também de pedradas e óleo quente que podia ser derramado sobre suas cacundas. Se mesmo assim os insistentes invasores conseguissem subir o muro, ainda tinham que lutar com os chineses que de bonzinhos nunca tiveram nada.

Fomos andando sobre a muralha, subindo e descendo, subindo e descendo. Finalmente vimos uma torre que parecia a última acessível naquele trecho. Vários outros turistas do nosso ônibus já estavam lá (já não somos tão garotos e éramos os únicos de chinelos, um deles Ming Xing...). Caminhamos mais um tanto e por fim chegamos. Nossa surpresa foram os aplausos. O grupo que chegou antes da gente, formado por jovens da igreja Metodista dos Estados Unidos havia feito apostas entre eles se nós dois, por estarmos calçando chinelos conseguiríamos chegar até o fim. De fato nossos pés estavam moídos, mas valeu.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

China - parte 6

Calçados

Havíamos esquecido nossos confortáveis tênis de corrida em um ônibus no Nepal, de forma que só nos restavam nossas havaianas. A de Pretinha pelo menos era original, como todos conhecem. Já a minha foi comprada numa banca na Tailândia e consumia meus pés. Já nas primeiras horas de uso ela se deformou e além de ferir a lateral do dedão machucava o calcanhar, pois eu acabava pisando dobre um dos pontos onde a correia se prende à sola. Não dava! Preferia comprar um chinelo Ming Xing a continuar com aquilo. Foi o que fizemos. Até comprarmos um pisante responsa esta seria a solução.


China - parte 5

Tian Tan (Temple of Heaven)

Em todo mundo, ainda hoje as boas colheitas nunca podem ser garantidas apenas com o conhecimento das técnicas de produção agrícola. Neste caso rezar para São Pedro, pros ancestrais, fazer sacrifícios e oferendas ao além nunca é demais. No século XV foi erguido então este conjunto de templos para que mais gente pudesse rezar mais e melhor por sucessos no agrobusiness.

Chegamos lá de metrô. Dentro do complexo, que preserva vários jardins, logo na entrada várias atividades eram oferecidas a idosos, sejam esportivas, danças e ginásticas. Era muito legal ficar observando eles brincando e rindo até as orelhas.

O prédio principal (no qual não se pode entrar, mas apenas olhar da janela) é circular, com três terraços sobrepostos. As telhas são esmaltadas. Durante a visita o céu desabou. Choveu forte e a correria começou. Encontramos um abrigo e lá ficamos vendo os outros correrem de um lado para o outro. Como é tudo muito bem pintado, o contato com a água fez as cores brilharem ainda mais. Se você um dia for a este lugar, torço para que não chova. Mas se chover, preste atenção a este detalhe.

sábado, 18 de agosto de 2012

China - parte 4

A cidade proibida

Este lugar é um daqueles obrigatórios quando se visita Beijing. Trata-se de um complexo de centenas de prédios construídos basicamente de madeira seguindo o mesmo estilo arquitetônico, de onde o Império Chinês foi administrado durante séculos.

É uma cidade dentro de outra. Apenas o imperador, sua família e empregados importantes tinham acesso e quem ousasse dar uma de penetra era executado de forma especialmente dolorosa. Sua construção levou 14 anos e foi finalizada em 1406. Está na lista da UNESCO dos patrimônios da humanidade e é o maior complexo arquitetônico construído em madeira do mundo. Pois bem. Na segunda guerra os japoneses arrasaram o lugar e fizeram uma limpa nas obras de artes. Mas ao fim do conflito os apetrechos foram devolvidos e a reconstrução se iniciou imediatamente. Até hoje trabalhos arqueológicos fazem descobertas no local.

Chegamos lá logo pela manhã e nos misturamos na multidão. Montes e montes de turistas chineses e do resto do mundo, soltos ou em grupos fazem uma algazarra que não tem muito a ver com a paisagem, que expressa muita calma e harmonia. Tudo bem, afinal, todos tem o mesmo direito que eu de conhecer um lugar como aquele. Outro ponto negativo é que nos locais mais importantes, no interior de alguns templos e palácios não é permitida a entrada. Apenas uma janelona ou porta fica aberta para que seja possível a vista de quem está de fora. Nestes pontos sempre há várias dezenas de turistas apinhados.

O lugar é muito interessante e bem cuidado. Depois de algumas horas circulando, é possível que as vistas comecem a se repetir. Mas isto não chega a ser problema.


 Kung Fu

Da mesma forma que não se pode sair de Buenos Aires sem assistir a um bom show de tango, ninguém deveria sair de Beijing sem ter visto uma apresentação de Kung Fu. Esta arte marcial tem uma beleza ímpar e trabalhada com talento por pessoal do teatro se encaixa bem com cenas dramáticas e com o balé.

No show que fomos até os corredores entre as cadeiras são usados para as interpretações. Por um preço muito mais baixo que os pagos em Buenos Aires temos um espetáculo muito bem elaborado envolvendo dança, Kung Fu, interpretação, canto, cultura, etc. Os atores são mulheres, homens e crianças. Como os espetáculos são à noite o turista pode colocar na sua agenda sem medo de encavalar com as outras atrações da cidade.





China - parte 3

Beijing

Partimos de Hong Kong rumo a Beijing e fomos apreciando a paisagem do país socialista. Chegamos a Beijing com o dia ensolarado. Apesar das dificuldades que tivemos para a obtenção do visto a entrada no país foi muito tranquila. O que nos fez pensar que os problemas que tivemos foi mais obra de incompetências localizadas do que um esforço estatal para evitar a presença de turistas. Afinal, se não nos quisessem, qual o motivo de terem gastado tanto para fazerem as Olimpíadas de 2008.

No aeroporto pegamos o metrô, aliás, até o momento o melhor e mais abrangente que usamos. Cerca de 1 hora depois estávamos no hotel. Ficamos hospedados bem no miolo do centro histórico de Beijing, a uns 15 minutos da Cidade Proibida. A turminha que fazia o hotel funcionar é bastante simpática e prestativa. E dias depois descobrimos que nosso hotel era uma das atrações turísticas da cidade. Bem que achávamos estranho vermos toda hora chegar um grupo de turistas acompanhado de guia e depois irem embora. Nosso quarto era simples, mas espaçoso. Pudemos lavar nossas roupas, descansar bem e ter uma boa base para explorar a cidade.

As atrações da capital são incontáveis. E como vínhamos de países que por vários motivos nos esgotaram, decidimos concentrar nossa estadia no país em Beijing.

Praça Tiananmen

A praça Tiananmen ficou famosa com o nome de Praça da Paz Celestial. Fica bem no centro de poder do país. Num dos lados está nada menos que a Cidade Proibida e há uma série de atrações ao redor. O lugar é muito bonito e pede alguns dias para uma boa exploração. Como estávamos na parte antiga da cidade, caminhar pelas ruelas era sempre divertido.

Em 1989, eu ainda criança acompanhei os protestos de estudantes, intelectuais e trabalhadores chineses que ocorriam nessa praça. Uma das imagens mais interessantes do século 20 foi gravada lá: um jovem se postou em frente a uma fila de tanques e conseguiu que eles não avançassem. Porém, dias depois desse fato o governo chinês acabou com a brincadeira e expulsou dezenas de milhares de pessoas da manifestação a tiros de metralhadoras e com o uso de tanques.



Como a liberdade de imprensa nunca foi o forte da China, nunca foi possível levantar quantas pessoas realmente morreram ali. Números variam de 500 a 4000. Lembremos que o protesto era pacífico.

Pois bem, estávamos lá justamente no dia 05 de julho, data de aniversário do ocorrido. O governo faz um evento lá para lembrar não sabemos o que. O clima é tenso, pois sempre há a possibilidade de algo violento acontecer. Alguns civis andam com uma braçadeira verde no braço. Apuramos que são uma espécie de voluntariado civil pela segurança e recebem o equivalente a 200 dólares por mês para auxiliarem as autoridades com informações se virem algo estranho. Uns dedos-duros.

Então, no albergue eu perguntei a uma funcionária, menina de uns 20 anos sobre as braçadeiras e ela respondeu como se não fosse nada demais. Aí eu fiz de bobo e perguntei se tinha algo a ver com os ocorridos de 1989. Ela estufou os olhinhos e perguntou assustada: “você sabe do que aconteceu???!!!!”. Como eu respondi que sim e com alguns detalhes ela estufou os olhinhos mais ainda e tentou pular fora da conversa.

Mais tarde eu perguntei a mesma coisa para um cara mais velho e a conversa foi mais tranquila. O que eu senti em Beijing é que todos sabem que vivem em uma ditadura, gostariam de ter alguns direitos que nós temos, mas que estão aproveitando bem esta fase de crescimento que já dura décadas. Ou seja, com grana no bolso os ânimos se acalmam.

Aproveitamos bem a nossa localização e fizemos tudo o que podíamos e que era de graça. Há lá um museu de artes enorme, com o pé direito de dezenas de metros. Mas parece que faltou o mais importante: as obras. Tudo bem, as telas lá eram legais, mas pela suntuosidade da construção esperávamos encontrar a Monalisa em pessoa.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

China - parte 2

Um pouco de História

A história chinesa é registrada desde o século XVI a.c.. Possui uma das civilizações mais antigas a existir de forma contínua. A partir do século II a.c. já se registra um império com enorme extensão territorial. Um eficiente sistema burocrático e um alfabeto único disseminado em uma vasta região possibilitou as seguidas dinastias controlar o império. Este se separou e se reagrupou algumas vezes e potências externas dominaram o país em outras ocasiões, o que ajudou a moldar a cultura chinesa. Dinastias e mais dinastias se sucederam por mais de 20 séculos. A última, Qing, teve seu fim decretado em 1912.

Várias descobertas que mudaram os rumos da humanidade foram façanhas chinesas, como a pólvora e a bússola. Desenvolveram o Kung Fu, uma das artes marciais mais eficientes e belas, a acupuntura e uma culinária extremamente diversificada e saborosa. Navegaram por todo o globo quando os europeus se recusavam a aceitar a redondeza da Terra. Inclusive estiveram no Brasil bem antes de Cabral.

Ter os mongóis como vizinhos teve o seu custo. Certa vez o país estava dividido e os Mongóis conseguiram subjugar todos os sub-reinos, o que vez a China ser parte do império mongol sob o domínio de Kublai Khan.

Apesar de contar com uma enorme população, o domínio da fabricação do aço, de serem experts em artes de guerra, disputas internas sempre minaram ou mesmo causaram a separação do território. Esta desordem foi bem aproveitada por potências europeias e até os Estados Unidos chegaram a dominar a força fatias de terras chinesas.

Os ingleses se lambuzaram no mel, obrigando a china a liberar o consumo de ópio produzido na Índia e arredores. A China tentou proibir a venda e o consumo da droga por duas vezes e nas duas a Inglaterra respondeu com chumbo, vencendo as duas Guerras do Ópio. Numa dessas Hong Kong foi cedida aos ingleses por 99 anos como indenização. Assim, o país entrou no século XX humilhado e ofendido.

Um movimento republicano pôs fim à última dinastia chinesa em 1912. Mas a república não conseguiu se manter e uma sucessão de conflitos, governos militares, assédios comunistas de influência soviéticas, guerrilhas e o que mais foi possível manteve o país completamente avacalhado entre 1912 e 1949.

O Japão se aproveitou como pode na Segunda Guerra e se não fosse a enorme população e a vastidão territorial, certamente teria dominado todos os recursos e dado mais trabalho aos aliados no conflito. Durante o conflito, dois lados políticos que faziam uma guerra civil se juntaram para tentar forçar a retirada dos japoneses. Os japas se foram e a guerra civil continuou.

O Partido Comunista Chinês (PCC) que mantinha uma guerrilha agora liderada por ninguém menos que Mao Tse Tung finalmente em 1949 chega ao poder. Toda a organização do país de agora é uma sequência deste movimento. Não é a toa que fotos de Mao estão espalhadas por todo país, em prédios públicos, dentro de casas e estabelecimentos.

Deste então a China deixou de ser um país vira-latas e assumiu uma postura imperialista que tem seu poder cada vez mais presente no globo. A invasão do Tibete, o apoio ao genocídio praticado pelo Khmer Vermelho no Camboja, tensões com o Vietnam, ameaças constantes a Taiwan (onde se exilaram os fugitivos quando Mao tomou o poder), guerra contra a Índia, uma ditadura em vários momentos muito violenta fazem do país um dos mais temidos do mundo.

Possuem um vasto arsenal nuclear, é um dos três únicos países com capacidade de enviar e trazer de volta homens ao espaço (junto a Estados unidos e Rússia); possui submarinos nucleares, etc, etc. Ou seja, ninguém quer mais ter a China como inimiga. Sua economia cresce muito a cada ano. Não raro apresenta crescimento acima de 10% ao ano. O resultado disso já é visível nas ruas e casas mesmo no Brasil, onde carros, eletrônicos e todo tipo de bugiganga está pra todo lado.

É um país hoje com poder de decretar uma crise econômica mundial quando bem entender. Em algumas décadas se consolidará como a maior economia do planeta se a projeção de crescimento se concretizar.

Espero que não sejam vingativos. E se forem, que lembrem-se que o Brasil nunca fez nada de mal para eles. Indo por esta linha de pensamento, portugueses, ingleses e japoneses devem ir dormir todas as noites se borrando...

China - parte 1

Visto

A china em nenhuma etapa do planejamento ficou de fora dos planos. Era um país de nosso interesse, os custos prometiam ser baixos e sua localização é privilegiada. Mas a burocracia para obtenção de vistos quase nos fez desistir. Para começar, estávamos informados que um visto de turista tinha validade de 90 dias após a emissão. Então tivemos que iniciar a viagem sem o documento e tentaríamos a sua obtenção em alguma embaixada pelo caminho.

A primeira tentativa foi em Bangkok, mas a fila era tão grande que desistimos, pois naquele dia ainda tentaríamos o visto da Índia. A segunda vez foi no Vietnam. Entramos na embaixada, pegamos o formulário e o preenchemos. Fomos atendidos por uma mulher muito mal educada. Escolhemos no formulário uma opção que nos cobrava 40 dólares de cada e o prazo seria de 3 dias para a emissão. A data de entrada seria para dali a um mês e a de saída para uns 20 dias depois, ou seja, tudo incluído no período dos três meses.

Esta regra estava escrita no próprio formulário. Porém, a mulher mal encarada disse que o prazo de validade do visto era de apenas 1 mês e nossa data de entrada já estaria fora da validade do visto. Não entendemos e apontamos a parte do formulário impresso que dizia que a validade era de 3 meses. A vaca pegou os formulários, fez um “X” de todo tamanho em cima do 3 e escreveu por cima o número 1, indicando que a validade do visto agora era de apenas 1 mês após a emissão. Recolhemos nossos documentos e fomos embora.

A derradeira tentativa já foi no Nepal, último país antes de adentrarmos nos domínios chineses. Ali a coisa era um pouco mais delicada, pois a questão do Tibete ocupado pela China é latente. O Tibete é uma área espremida entre o Nepal e a China. O governo chinês só permite a visita de turistas ao Tibete através de agências estatais, de forma que o turista só visitará pontos escolhido pelo governo e só poderá escutar a versão da China em relação ao covarde domínio sobre o Tibete.

Há um atendimento diferenciado só para monges tibetanos (não sabemos se é pior ou melhor do que o convencional). Há pouca informação em inglês e o processo burocrático é bastante complicado. Preenchemos o formulário, pegamos a fila e entregamos a documentação. 4 dias depois retornamos e pegamos de volta os nossos passaportes com os vistos. Surpresa! Os vistos tinham 3 meses de validade, ao contrário do que definira a funcionária da embaixada da China no Vietnam. Concluímos naquele momento que a China estava se lixando para o turismo no país. Acostumada ao ritmo acelerado de crescimento com pleno emprego na indústria, parecem ter decidido abrir mão da grana que entra através do turismo. Sem contar que isto evitaria que as pessoas voltem para casa falando mal do regime do país. É chato começar um país com esses pensamentos. Fazer o que?

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Hong Kong

Hong Kong

Politicamente esta região pertence à China. Trata-se se uma das duas regiões administrativas especiais da China, sendo Macau a segunda. A gente praticamente foi obrigado a fazer uma escala lá, devido aos pormenores do nosso bilhete aéreo. Resolvemos passar 3 dias pra aproveitar a escala.

Um pouco de história

Hong Kong era parte do Império Chinês quando Jorge Álvares, um português, se tornou o primeiro visitante europeu. Já o Reino Unido estabeleceu contato através da Companhia Britânica das Índias Orientais. O Reino Unido venceu a Guerra do Ópio em 1842 e ocupou a área. A China, insatisfeita com o cenário imposto tentou se rebelar e foi novamente dominada décadas depois. Em 1898 os dois países firmaram um acordo no qual a China cederia Hong Kong por 99 anos. Desde então Hong Kong se tornou um importante centro comercial.

A região, ao longo do século 20 sofreu vários reveses por vários motivos: problemas mal resolvidos entre China e UK, guerra entre China e Japão, Segunda Guerra Mundial, Guerra da Coreia (Estados Unidos). Mas entre os anos 50 e 60 se tornou também um grande centro industrial. Houveram conflitos internos por melhores salários e condição de vida que foram habilmente resolvidos. Os anos 70 foram relativamente estáveis e já no início da década seguinte China e UK iniciaram conversações para a devolução da área. Em primeiro de julho de 1997 a região foi reintegrada a China. Em 20 de dezembro de 1999 Hong Kong foi declarada pela China como Região Administrativa Especial. É um porto livre e um centro financeiro internacional. Tem um alto grau de autonomia, exceto nas áreas de defesa e política externa. Não paga impostos ao poder central chinês e possui seus cidadãos gozam de liberdade de imprensa nos padrões de quando eram colônia inglesa.

A Cidade

Hong Kong é a cidade mais organizada na qual pisamos até este momento em nossas vidas. Seus quase 7 milhões de habitantes parecem saber se organizar muito bem e não vimos engarrafamentos, lixo pelas ruas, poluição sonora excessiva, etc. São comuns conjuntos residenciais com dezenas de prédios de mais de 40 andares. No centro da cidade funciona uma metrópole no subterrâneo. O metrô, os ônibus, tudo trabalha direitinho. Ahh, que coisa chata!

Ficamos em um albergue que funcionava dentro de um prédio comercial. Era até divertido. A gente entrava e tinha que andar pra caramba no meio de pessoas de todas as partes do mundo: indianos, quenianos, árabes até chegar ao elevador. O quarto era minúsculo, mas comportava 3 beliches. Eu não conseguia me sentar na parte de cima sem tocar a cabeça no teto. Mas foram apenas duas noites e tiramos de letra.

A única coisa que programamos para fazer em Hong Kong foi tentar o visto da Mongólia, que não deu certo. Passamos nosso tempo passeando pela cidade e valeu a pena. À margem da bacia fica a Avenida dos Artistas, com várias figuras, marcas das mãos e pés de vários famosos e uma bela estátua de Bruce Lee, que viveu muitos anos na cidade antes de se mudar para os Estados Unidos.
 

Mas é a noite que a cidade realmente brilha. Parece haver uma competição entre prédios para ver quem chama mais a atenção e o resultado é muito bom. Aquilo tudo brilhando refletindo na água da baía pode ocupar facilmente um passeio noturno.

Tive que consultar com um médico também, pois suspeitava de estar com infecção urinária. Achamos por acaso uma clínica no prédio do escritório da embaixada da Mongólia. A médica que me atendeu conhecia o Brasil e o papo rendeu. Nos deu algumas dicas sobre a China e a consulta fluiu tranquila. O custo da consulta, remédios e exames foi baixo, pouco mais alto que a franquia mínima do nosso seguro e por isso nem o acionamos.

Mas Hong Kong era só uma paradinha e nem tentamos ficar mais tempo. A China nos esperava.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Nepal - parte7

Os refugiados

Os dias anteriores foram violentos em várias partes do país, de modo que nossa partida para a capital se deu em comboio. Vários ônibus partiram no mesmo horário e uma viatura foi à frente, de batedor. Os piqueteiros não tem interesse em avacalhar os planos de turistas, mas a ideia deles é que os funcionários de empresas de ônibus não turísticos devam parar de trabalhar, e que os habitantes devem participar das manifestações e não aproveitar para viajar.

Então é comum fazerem parar os ônibus de turismo e verificar se todos são realmente turistas, pois algum nepalês pode topar pagar mais caro para viajar. Passamos por vários pontos de checagem até que a viagem realmente acelerasse. Na primeira parada, dois colegas do nosso ônibus se aproximaram. Um de traços orientais, parecido com os chineses e o outro com cara de nativo mesmo. Nos perguntaram se a gente aceitaria o segundo como nosso guia, só que de mentirinha. Então nos explicaram. Eles eram tibetano-nepaleses. Nasceram no Nepal em um campo de refugiados tibetanos. Caso fossem questionados pelos grevistas um se passaria por chinês e o outro seria nosso guia.

Ficamos conversando sobre a situação do Tibete ocupado pela China e aprendemos um pouco sobre a vida de refugiados. Um deles era guia de verdade, mas não tinha nenhum registro dessa profissão. Perguntamos a razão e era simples: como era refugiado, não podia se registrar no Nepal como nepalês. Porém, um Assentamento tampouco tem autoridade ou recurso para emitir documentos de identidade. Logo eles não tinham sequer uma certidão de nascimento.

Bom, não ter documento é uma coisa ainda recorrente no Brasil. Mas é completamente distinto da situação de um refugiado. O cara fala tibetano, nepalês, inglês e francês, tudo aprendido no assentamento e não consegue ter um RG! Possivelmente não tem acesso a serviços de saúde, não tem como ter um trabalho registrado e deve ter dificuldades até para comprar um celular. E o pior: eu não vejo o menor movimento de grandes nações no sentido de exigir da China que liberte o Tibete. Ninguém quer ter a China como inimiga. O máximo que se consegue e alguma mídia através das aparições do Dalai Lama, algumas manifestações de organizações civis e uns mochileiros com camisetas “Free for Tibet”.

Até mais ver, Nepal

Não tínhamos tempo nem pique para fazer trekkings pesados e por isso fomos nos despedindo do Nepal. Levamos uma impressão forte, tensa e ao mesmo tempo carinhosa daquele povo. São pessoas pobres, religiosas e muito amistosas. Por outro lado produzem bravíssimos guerreiros, apesar de pequenos fisicamente, são fortes como búfalos e são muito trabalhadores.

As paisagens dos morros transformados a golpes de picaretas em campos planos, produzindo arroz é uma prova. Homens e mulheres subindo e descendo as trilhas com balaios presos à cabeça carregados é outra. Os recursos naturais provavelmente ainda estão por ser descobertos. Eles pensam que são o segundo em recursos hídricos, mas eu até agora não consegui confirmar isto. Energia elétrica eles não tem nem para manter a estrutura atual funcionando. E olha que boa parte da população vive em aldeias.

A conclusão final é de que se trata de um povo admirável, mas que há séculos é muito mal administrado. Serve de lição para a gente. Por pior que sejam as opções que temos em nossas eleições, só o fato de elas acontecerem regularmente já nos coloca em outra situação. E por pior que pareçam os candidatos, temos que sempre estar atento para fazermos as melhores escolhas.

domingo, 5 de agosto de 2012

Nepal - parte 6

Pokhara

Depois de alguns dias na capital rumamos para Pokhara, a segunda cidade mais importante para o turismo no país. Lá é o ponto de partida para os trekkings pelo ao redor do Annapurna, pico com 8091m de altitude, além de ter um belo lago e voos de parapente. Essas caminhadas estão entre as atividades turísticas mais populares do Nepal. Na caminhada passa-se de 3000m de altitude e de vários pontos se aviste de “perto” a montanha. Não fizemos este passeio. Uma trilha dessas pede de vários dias de caminhada e não estávamos preparados para isto. Nosso esquema era mais relax.



Tiramos um dia para andar de barquinho no lago e logo pela manhã alugamos nossa canoa. A negociação é pesada, mas necessária. Acho chato, mas Renilza gosta do confronto. Acaba sendo um exercício, pois na China, sabemos que é ainda pior. Atravessamos o lago, fizemos um piquenique em uma prainha e jogamos baralho. Estávamos sozinhos até que três garotos chegaram também em uma canoinha mais rústica que a nossa. Na verdade já nos bisbilhotavam de longe, mas não ligamos.

Eles eram curiosos e ficaram rodeando, olhando as cartas e tentando entender o jogo. Um deles pegou nossa câmera e começou a mexer. Interrompemos o jogo e os mostramos como funcionava, tiramos uma foto deles. Algumas crianças gostam de serem fotografadas só para verem suas fotos no visor da máquina depois, simplicidade pura. O menor dos garotos, de 13 anos, nos pediu cigarro. Eu disse que não tinha e que ele era muito novo para fumar. Ele disse que era para o mais velho, que não falava inglês e teria 15 anos. Dissemos que ainda assim era  muito jovem e mesmo que tivéssemos não daríamos cigarros a eles... mas na Ásia se fuma muito mesmo. Foram embora e pouco depois fomos também.

Pesquisamos preços de voos de parapente, mas o mais barato conseguimos com o próprio dono da guesthouse, que ainda nos arrumou emprestado dois pares de tênis, já que tínhamos perdido os nossos e queríamos esperar para comprar novos na China. O bicho pegava no país, a vários dias em greve geral. Para evitar confusão, para ir para a rampa tivemos que acordar às 4 da madrugada, para subir com os pilotos e seus equipamentos. Tivemos que esperar até por volta das 10h para voar. Como recompensa acompanhamos minuto a minuto o nascer do sol, avistando o Annapurna. Esperamos muito e conversamos bastante com os rapazes, aprendemos um bocado sobre o Nepal, Índia, parapente.

Renilza foi primeiro, com um piloto indiano. Fiquei preparado, com a câmera ajustada para filmar sua decolagem e registrar o inevitável grito. Mas ela foi tranquila. O piloto tentou algumas vezes aprumar a vela (o paraquedas em si), Renilza já presa ao seu equipamento e quando a vela se inflou ambos correram rampa abaixo. Se descolaram do chão e lá se foi minha mulher. Voou para um lado e para outro e foi subindo.



Tive que esperar um pouco para voltar a ventar. O meu piloto é búlgaro e fala português. Yassin é um cara interessante. Esteve no Brasil para uma competição internacional de parapente, em Araxá e ficou 3 meses. Sabia que Dilma era de origem búlgara e sabia muito mais do Brasil. Ele disse que queria voltar lá. Gostou muito das “mulheres pretas”. Ele era DJ e gostava muito da música brasileira. Falou de artistas que eu nem conhecia. Finalmente o vento veio e ele conseguiu aprumar a vela.

Para pegar voo não é tão difícil. Quando o piloto te manda correr você tem que disparar morro abaixo, arrastando junto com ele o equipamento contra o vento. Fomos de encontro ao precipício, mas vários metros antes do limite meus pés já não tocavam o chão e estávamos voando. Aproveitando as correntes de ar o piloto vai posicionando a vela e a gente vai subindo. A vista da paisagem neste tipo de voo é especial. Pode-se ver detalhes dos quintais das casas, as pessoas, animais, a geografia, tudo com o vento batendo na cara. Eu fiquei um pouco enjoado, mas não atrapalhou o passeio. O Yassin me ensinou a direção em que devia apontar a cara caso eu vomitasse, mas não foi preciso. Se você quiser o cara faz acrobacias, mas é claro que eu não queria. Enfim, pousamos. Me encontrei com Renilza que pousara pouco antes e fomos ao escritório pegar nossos DVD’s.

Na manhã seguinte voltamos para Kathmandu.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Nepal - parte 5

The Last Resort

O nome tenta indicar que este seria o último resort do Nepal naquela direção. Deve ser mesmo. Em linha reta deve ficar a menos de 15 quilômetros com a divisa com o Tibete. A proposta de um dia longe do agito de Kathmandu era boa, até porque lá sempre faltava energia elétrica. Pagamos por dois dias lá e fomos embora em um micro-ônibus com mais um monte de turistas. No caminho fomos parados umas 10 vezes. Coisa comum no Nepal: estradas bloqueadas pelo exército para averiguação. Param o veículo, um soldado entra, dá uma olhada pra cara da turma e manda seguir. Raramente pede passaportes. Os ônibus para os moradores locais vão lotados, com gente dependurada, malas presas no teto e ás vezes até um bode pode ir amarrado por cima.


Chegamos. No primeiro momento, agradeci a Deus por Renilza ter decidido saltar de Bungee Jump na Nova Zelândia e eu ter sido obrigado (por dever de macho) a segui-la. Para se acessar o resort há que se atravessar um vale altíssimo por uma pinguela. Ok, ela é toda de aço, com cabos, telas e chapas. Porém, dela se salta, se não do mais alto, de um dos mais emocionantes Bungee Jump do Mundo. Salta-se também de Canyon Swing. É como um Bungee Jump, só que o elástico fica preso em um cabo de aço a uns 50 metros da ponte, no mesmo nível dela. Então, quando o sujeito pula, antes de o elástico começar a sofrer a tensão o corpo vai descrevendo um arco. São mais de 100 metros de queda livre e chega-se à velocidade de 160km/h. Ao todo são 160m de altura. Deus me livre! Perto deste o de Taupo, na NZ parece um balanço de parquinho. Esse realmente dá medo. Ainda bem que minha missão já estava cumprida.  


Fomos apresentados ao resort e á nossa tenda. Olha, é melhor que muito quarto de hotel em que ficamos nesta viagem. Além de tudo, era no meio de uma floresta, em um vale gigantesco. O tempo todo se escuta um barulho forte, mas relaxante, das corredeira de um rio nas proximidades. A comida no Resort era ótima também, e livre. Quase que ficamos só a comer e dormir. Mas deu vergonha e então fomos fazer um trekking. 


Trekking

Éramos nós, uma alemã e o guia. Começamos a subir. E subimos, subimos, subimos. Em 10 minutos já botávamos os bofes para fora e o guia, um senhor de uns 50 anos ia tranquilo. A trilha ia fazendo um zigue-zague e a cada momento pensávamos que ia acabar a subida, mas apenas mudávamos a direção. De tempo em tempo parávamos e o guia nos contava algo. Vale lembrar, as montanhas no Himalaia são imensas. Fazem as de Minas parecerem cupinzeiros. E os nepaleses estão adaptados a elas. Ou melhor, adaptam as montanhas a eles. Fazendo cortes tipo escadinhas, transformam montanhas em um conjunto de incontáveis patamares planos, onde criam gado, cabras, galinhas e plantam de tudo, mas principalmente arroz. Esta é a paisagem típica do Nepal.


Em uma das paradas se podia avistar nas montanhas a nossa frente várias aglomerações, como aldeias. O guia nos explicou que em várias delas se falava línguas diferentes entre si, mas o nepalês unificava todo o país. Falou dos desastres causados por desmoronamentos. Algo relativamente previsível em um país tão montanhoso e pobre, afetado por monções.

E continuávamos subindo. Em outra parada, avistamos no horizonte um pico altíssimo, coberto de neve. O nome era praticamente impronunciável. Já estaria no Tibete. Neste momento, enquanto recuperávamos o fôlego, já encharcados de suor, dois homens, pai e filho, se aproximaram de nós pela mesma trilha, subindo o morro carregando lenha. Pararam, conversaram com o guia (eram conhecidos). Carregavam cerca de 30 quilos cada, mas segundo o guia, alguns homens subiam aquele mesmo morro com quase 70. Incrível!


Continuamos e por fim chegamos ao cocuruto da montanha, onde funcionava uma escola primária. Todos ficaram radiantes por nos verem. As crianças, entre 6 e 10 anos nos olhavam sorridentes e à menor atenção, respondiam com as mãozinhas juntas ao peito: “Namastê!”.


Via-se claramente que eram muito pobres. A professora deixou que nos fotografássemos mas deixamos que a aula de Inglês continuasse. A escola era paupérrima. Salas pequenas, o quadro era a própria parede pintada de cinza. As crianças se sentavam no chão e usavam uma mesa de pés curtos. Deve ser normal isso no Nepal. Em outra sala as crianças estavam sozinhas, sem professora. O guia nos explicou que ela havia faltado e que era comum as crianças passarem vários dias sem professores. Neste caso, a professora de outra turma passava alguma atividade e elas iam se virando. Mais namastês e fotos e as crianças voltaram ao livro. Como viram que não íamos embora, começaram a cantar uma canção folclórica em coro enquanto faziam as atividades.

É fácil se emocionar. Enquanto no Brasil crianças nesta idade já ameaçam professores de morte... dá vontade de fazer alguma doação ou algo para ajudar, mas é preciso ter cuidado. Ajudar não é fácil, e doação seguindo apenas impulsos emocionais é praticamente esmola, que quase nunca realmente ajuda. E, num país onde 52% das pessoas são analfabetas, uma criança estar em uma escola em frangalhos e aprendendo inglês já é um privilégio. Demos tchau e fomos.

Finalmente começamos a descer, para voltar. Depois de moer os músculos das coxas na subida, era hora de estragar os joelhos. Quase duas horas morro abaixo. Chega um momento que nenhum santo quer ajudar. Paramos numa casa onde uma mãe nos mostrou e nos ofereceu um bebê recém nascido. Era brincadeira. Num curralinho ao lado, um bezerro búfalo foi se achegando e começou a lamber meu braço com sua língua preta. Devia ser o sal. Descemos mais um tanto e estávamos de volta para um almoço responsa.

No dia seguinte pegamos o busão de volta para Kathmandu. Esquecemos uma sacola com nossos tênis dentro do ônibus. A partir de agora só tínhamos nossas havaianas. A da Renilza ainda era a primeira, mas a minha era uma falsificada comprada na Tailândia que machucava meus pés em vários pontos.